A revolta dos beaglemaníacos, ou a “hipocrisia” dos salvadores

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O autor fala algo como esquizóide, ou com traços de, o sentimento que vem movendo ou promovendo a grande gama de manifestações de protesto de todo tipo pelo país. Eu acrescentaria uma pouco de desinformação e hipocrisia. 

É o caso emblemático do tal resgate dos cães em laboratório em São Paulo. Este frase/pergunta do autor do texto ilustra muito bem isso: Sabe aquele batom vermelho bonito que embeleza a ativista? Então, será se ela sabe que só está usando com segurança este fetiche graças aos cães que bravamente foi resgatar?

Porque então não parar de usar toda sorte de produtos de beleza e cosméticos de todo tipo que só se tornaram possíveis graças aos testes em animais? Até a ração ou “biscoitinho” que compra para o seu “pet” em casa só é possível graças aos mesmos cães “heróis”?

E o que falar, ou justificar, sobre a destruição de equipamentos e computadores da empresa no ato da “salvação”?

Parece – mas não é – que sou a favor do sacrifício dos animais para garantir o nosso bem estar. Também, não sou a favor do seu sacrifício para garantir o churrasco do fim de semana ou o cardápio suculento das refeições diárias. Também, não condeno quem faz uso destes produtos. Embora eu não o faça. O que acho é que deveria existir um pouco mais de consciência e menos hipocrisia.

"Muito difícil falar sobre isso, já que os cachorros são o melhor amigo do homem e tocam o nosso coração" - Leilane Neubarth na Globo News.
Então deixa comigo, Leilane: 
Um espírito cívico despertou de maneira avassaladora no coração dos brasileiros. O gigante, que passou décadas hibernando em seu berço esplêndido, acordou com uma fome de protestos capaz de fazer inveja até mesmo aos nossos hermanos argentinos.
Acontece que o gigante despertou um tanto esquizofrênico confuso, revoltado contra tudo e contra todos. A insatisfação com o serviço público, a corrupção dos políticos e a lentidão da justiça fizeram nosso gigante partir pra ação direta. Esqueça os meios legais, a burocracia da justiça - toda essa coisa lenta, inútil e chata. Agora que tiramos a bunda do Facebook ninguém mais nos segura.
Basta uma olhadinha para os últimos meses para relembrarmos alguns capítulos dessa marcha: incêndio no Itamaraty, agressão a jornalistas, pedidos de intervenção militar, Batman Black Bloc do Bem, a luta da sofrida classe médica contra escravização de cubanos, enfim, são inúmeros os exemplos dessa histeria coletiva instalada no país.
E, ao contrário do que declamou o poeta brasileiro contemporâneo, "pior que tá, fica" sim. Eis que surgem os protetores animais pra compor esse caleidoscópio lisérgico. Indignados com - vejam bem - SUSPEITAS de maus tratos em um instituto de pesquisa em São Roque (SP), ativistas animais ignoraram uma investigação do Ministério Público em andamento, se reuniram na Av. Paulista e partiram cheios de certezas rumo ao interior. Objetivo? Libertar cães da raça Beagle usados em testes farmacêuticos naquele instituto.
Essa gente boa arrombou o portão do local, invadiu e salvou os Beagles de forma épica. Segundo relato dos invasores do bem, os maus-tratos foram atestados e até um beagle com a língua cortada foi encontrado. Ainda segundo ativistas, havia também 100 ratos no local, entretanto não vimos fotos dos roedores sendo resgatados. Ao que parece, no mundo da proteção animal, cachorros e gatos desfrutam de condição privilegiada. Beagles e Yorkshires, então, estão no topo do ranking.
A ação foi rápida e acompanhada pela imprensa, além de ter sido transmitida ao vivo pela internet. Após o resgate cinematrográfico, nossos heróis ainda destruíram computadores, armários, equipamentos, enfim, coisas materiais, importantes apenas para aqueles cientistas cruéis incapazes de enxergar doçura no olhar de um beagle.
O monstruoso Instituto Royal, que está sob a lupa do Ministério Público (que nada de irregular encontrou até agora), nega os maus tratos: “Absolutamente. Eram tratados com muito conforto, com muito cuidado”, afirmou o diretor científico do Instituto em entrevista ao Fantástico. Disse ainda: “A população tem que entender que o que nós fazemos ali é para benefício da própria população. Quando a pessoa tem uma dor de cabeça, ela vai na farmácia e toma um remédio. Agora como esse remédio chegou até a prateleira? Nós não somos matadores de cães, matadores de animais. Nós não somos esses monstros”
Segundo o promotor responsável pelo caso, a depredação do local tornou a investigação sobre possíveis maus-tratos ainda mais complicada: “Com essa invasão, grande parte de provas que poderiam ser angariadas para a nossa investigação foram destruídas "
Conversando com ativistas no Twitter, percebi que a grande maioria não é contra apenas os possíveis maus-tratos, mas contra todo e qualquer teste científico que envolva animais, principalmente para fins cosméticos. O que nossos amigos do bem parecem não saber é que, direta ou indiretamente, TODOS os segmentos da indústria e da ciência se beneficiam de testes realizados em animais.
Sabe aquele batom vermelho bonito que embeleza a ativista? Então, foi testado primeiro em camundongo para que ela não corra o risco de adquirir um câncer na boca. Sabe a quimioterapia pela qual aquela vovozinha do bem está passando para se curar? Também teve que ser testada antes em algum animalzinho para que ela não morresse na primeira sessão.
Sabe o biscoitinho que você compra no supermercado para dar pro seu beagle que ajuda a evitar o tártaro? Vários componentes contidos ali foram testados antes em alguns exemplares da espécie para que milhares de outros - principalmente o seu - fiquem bem alimentados e não morram intoxicados.
Mas a marcha da insensatez prossegue. Pra melhorar, artistas do bem engrossaram a lista de insatisfeitos com essas pesquisas. Tico Santa Cruz, cuja banda toca mais em rodeios do que Luan Santanna, vociferou no Facebook contra o instituto de pesquisa. Luiza Mell, uma das heroínas de São Roque, também escreveu manifesto anti-Globo, anti-capitalismo e anti-tudo-o-que-você-puder-imaginar.
Eu fico aqui imaginando o mundo ideal dos black bloc beagles e das celebridades abraçadoras de causa. Como seria? Provavelmente leríamos o aviso em todas as pharmácias:
"Atenção, esses remédios nunca foram testados. Use por sua conta e risco. Mantenha fora do alcance de beagles". (Por Jornalismo Wando)


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2 comentários:

  1. Concordo com o q vc diz sobre a hipocrisia q há em tudo isso. A maioria desses ativistas não abre mão do seu churrasquinho domingueiro não é mesmo? Mas, afinal, qual é mesmo a diferença entre um Beagle, um York, um vira-latas e uma vaca? Para mim, nenhuma, mas para a maioria, milhões. Apesar disso, não podemos negar q a ação desses 'hipócritas' amplia a consciência da população e faz mexer com estruturas q se manteriam imóveis sem a sua atuação. Problema complexo, muito complexo, esse do ativismo, não é mesmo? Temos q ter muito cuidado ao tirarmos as nossas conclusões.

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    1. Olá, Fer!


      Boa a sua reflexão sobre a complexidade e desafios do ativismo. Entretanto, não creio que a notícia, sobretudo, assim – como poderia dizer? – de forma tão espetaculosa como foi este “resgate”, possa: “... amplia a consciência da população...”. Os hipotéticos benéficos são irrisórios diante da “pisada de bola” cívica e legal.

      O vandalismo irresponsável desta ação, ao contrario, poderia estimular a sensação de que a violência, o desrespeito às normas e leis possam ser caminhos para solução de qualquer coisa.

      Reivindicações e protestos são legítimos e necessários, mas, não precisamos apelar para “argumentos” e praticas próximas da barbárie.

      Como diria o outro: “Sou capaz de apostar”, que grande parte da turma de indignados costuma se locupletar com o churrasquinho nos fins de semana, inclusive, quem sabe? Para comemorarem o sucesso da empreitada.

      Esta “estratificação social” promovida no reino animal, com os cães e gatos alçados a categoria de quase humanos, satisfaz, na verdade, mais as carências e necessidades psicológico-existencias de seus donos, do que dos próprios animais em si mesmo. Bem como os “excluídos” satisfazem necessidades mais psicológicas do que nutricionais.

      Eu me considero um “ativista”, e sempre criei – e crio – cães e gatos resgatados das ruas, como resultado do “amor pelos animais” cansado de muita gente por aí.

      Bom você ter comentado e ampliado um pouco mais as possibilidades de reflexão e debate sobre um tema tão importante e que já caiu no ostracismo do cotidiano frenético de nossos dias.


      Um grande abraço

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